Quem faz os craques brilharem
O filósofo
Fernando José de Almeida fala de como o
coordenador pedagógico afina o time de
docentes da escola
Texto
Foto: Marcos Rosa
Fernando Almeida é vice-presidente da TV
Cultura
Não sei se você gosta de futebol. Eu
sou um grande fã e, por mais que a ideia pareça um pouco gasta, resolvi iniciar
este texto cometendo a imprudência de comparar a escola com uma equipe do
esporte. Começo pelos jogadores - alunos, professores, funcionários - e pela
torcida - os pais, a comunidade, todos os dirigentes da Educação e a sociedade,
muitas camisas incentivando para que o gol da aprendizagem aconteça.
Esse timaço não joga sozinho. Precisa
de um presidente - no caso da escola, o diretor. Referência de reflexão e
planejamento geral, é ele quem define as decisões mais gerais (o presidente
negocia patrocínios, o diretor constrói o Projeto Político Pedagógico e
estabelece parcerias), dialoga com a torcida (se o presidente recebe as
organizadas, o diretor cuida da articulação com a comunidade) e zela pela
agremiação (em seu "clube", o diretor faz a gestão administrativa, de
aprendizagem, do espaço e da equipe).
Mas um time só com presidente seria
meio capenga. Equipes de sucesso exigem um profissional que não apenas mergulhe
na história do esporte, mas que esteja antenado com as principais novidades na
área. Que domine a arte e a ciência do jogo não apenas para chamar a equipe à
unidade, estimule-a quando toma um gol inesperado - "Exatamente quando
estávamos jogando tão bem!" - ou a modere quando algum jogador se exalta.
No futebol, essa pessoa é o técnico. Na escola, é o coordenador pedagógico.
Para ser bem exercida, a função de
coordenador supõe um enorme conhecimento do conjunto da escola. Quem são os
alunos? Quais turmas apresentam maior dificuldade (e em quais disciplinas)?
Como trabalham os professores? Quais necessitam de maior auxílio na formação em
serviço? O que os estudantes estão aprendendo - e o que estamos fazendo para
ajudar aqueles que ainda não chegaram ao nível desejado?
Como se vê, o foco desse profissional
aponta fortemente para a gestão da aprendizagem e para a formação dos
professores. Isso inclui dominar algumas coisas que nenhuma faculdade ensinou a
ele: saber como o currículo foi desenhado, quando e como se articulam as áreas
do saber e quais os modelos de avaliação disponíveis. Apesar de não ser uma
tarefa fácil, ela é indispensável. É justamente o conhecimento das diferentes
disciplinas, de seus objetivos, de suas propostas de recuperação, da
bibliografia adotada e das metodologias propostas que conferirá a ele a
respeitabilidade dos professores. Isso exige muito estudo.
Vejo duas grandes perguntas a respeito
da atuação do profissional. A primeira: o que, exatamente, ele tem de saber? Eu
diria que a boa notícia é que ele não precisa entender de tudo. Sua função
primordial é procurar formas de ajudar os professores de todas as disciplinas a
avançar. A primeira edição da revista NOVA ESCOLA GESTÃO ESCOLAR traz um
excelente exemplo de como esse auxílio acontece na vida real. A reportagem Documentos em Ordem mostra como a coordenação
pedagógica pode orientar a equipe de professores na produção e montagem de
portfólios, registros, pautas de observação, diários de aula e notas, registros
fundamentais para o trabalho de qualquer docente.
A segunda pergunta: como (e onde)
conseguir esses conhecimentos? Os caminhos são diversos: uma boa visita às
livrarias da cidade, uma exploração atenciosa do acervo pedagógico na
biblioteca do bairro, programas de formação oferecidos pelas Secretarias e
outras instituições e a participação em seminários e congressos - com o
compromisso evidente de socializar as informações principais para os demais
profissionais da escola. Assim, o coordenador vai constituindo sua figura como
um parceiro e um orientador do trabalho docente.
Para isso tudo, o coordenador tem meios
de atuação difusos: a presença nas atividades pedagógicas que alunos e
professores promovem, a conversa individual com os docentes e a direção, as
apresentações de trabalhos, as organizações de estudos do meio, as visitas e as
festas, o material que ele torna disponível na sala dos professores, os avisos
que deixa no quadro e até mesmo a sala do cafezinho. Mas ele conta ainda com um
momento privilegiado. É o chamado Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo
(HTPC), período de formação em serviço durante o qual seu "jeitão"
aparece e se consolida. Ali, o coordenador desenvolve seu máximo trabalho:
fazer com que os professores, os verdadeiros craques do time escolar, brilhem (porque
são as estrelas e, afinal, cabe a eles preparar as aulas, trabalhar duramente
com centenas e centenas de alunos, corrigir provas e trabalhos, extenuar a voz
para ser ouvido e ainda readequar suas aulas ao seu plano inicial).
No HTPC, o coordenador ilumina o
trabalho dos docentes, colocando-os como o centro do processo de ensino e
aprendizagem: o que cada um deles faz de melhor? O que precisa aprofundar,
estudar mais, trocar com os colegas? É possível, por exemplo, levar para esse
horário uma prova tão boa, concebida por um dos integrantes da equipe, que
mereça ser estudada pelos colegas.
Atitudes assim põem em relevo a
liderança do coordenador pedagógico. Não se trata, aqui, de liderança como
imposição, mas como prestação de serviço, que junta as partes dispersas,
evidencia as coisas boas, participa do dia-a-dia, avalia rumos, dá ideias com
base nas necessidades, estimula práticas criativas de alunos e professores e
apoia o diretor para cumprir sua tarefa de construir caminhos para a escola
junto com a comunidade. Para retornar à metáfora futebolística, ele é um dos
que mais ajudam a bola a correr bem redonda no gramado. Como o técnico, pode
até não entrar em campo nem levantar o troféu, mas, sem ele, não existe time
campeão.
Fonte: revista nova escola